Cortar o cabelo parece tarefa simples, mas para Lucia Oliveira, de 50 anos, foi como uma homenagem ao filho que gostava quando ela aparava as mechas, algo que não fazia há dois anos. O jovem Paulo Henrique de Oliveira Silva, de 19 anos, morreu no dia 10 de setembro ainda suspeito de coronavírus, em Jundiaí (SP). O resultado confirmando a doença chegou quatro dias após o óbito.
Ao G1, Lucia contou que, conforme as mechas eram cortadas, as lágrimas surgiam ao lembrar-se do pedido do filho para cortar o cabelo. O corte curto era o preferido do jovem.
“Teve um dia que ele chegou do serviço e veio aqui no quarto. Eu estava me escondendo debaixo da coberta e ele pediu para eu descobrir a cabeça. Quando ele viu que não cortei o cabelo, ficou tão chateado. Ele queria que eu cortasse para ficar 'bonitona' no aniversário dele”, relata Lucia.
Três dias depois da morte, Paulo completaria 20 anos. Mesmo assim, a família se reuniu com um bolo e cantou os parabéns em homenagem a ele. "A gente cantou os parabéns agradecendo a Deus pelo tempo que ele viveu com a gente", explica.
Mesmo que o quarto do filho esteja vazio após doar os pertences, a presença continua viva no coração da mãe.
No dia da morte, Paulo estava na casa do pai dele e foi andar de skate. Quando voltou, começou a passar mal e uma ambulância foi chamada. Foram feitas manobras de reanimação, mas ele não resistiu. O último assunto que conversou com a mãe durante uma ligação foi sobre o corte de cabelo.
“Eu tinha marcado para ir no salão, mas quando eu soube o que aconteceu, eu não consegui cortar. Depois de alguns dias, fui cortar e cada tufo de cabelo caindo no chão, era arrependimento porque que eu não cortei antes para ele ver."
'Hoje ele é uma estrelinha'
Segundo a mãe, quando criança, Paulo gostava de deitar na laje da casa e olhar as estrelas. Ele acompanhava todos os sites que indicavam que algum fenômeno no céu ia acontecer. Lucia conta que se lembra de chegar em casa e o encontra-lo à noite em silêncio observando a imensidão do céu.
"Tem uma música que ele chegava cantando do serviço sempre, se chama 'Estrelinha' do Di Paullo e Paulino', é uma moda de viola. Ele nem imaginava que hoje ele é uma estrelinha."
"Quando bater a saudade, olhe aqui pra cima. Sabe lá no céu aquela estrelinha que eu muitas vezes mostrei pra você? Hoje é minha morada, a minha casinha." A letra que fala sobre a perda de um ente querido marcada em Lucia, que escuta a canção sempre que pode.
Homenagem na pele
Vinicius dos Santos Silva decidiu fazer uma tatuagem na mão em homenagem ao Paulo Henrique, com o número 11, do dia em que Paulo Henrique foi enterrado e também porque era seu aniversário. "É como um irmão gêmeo", relata.
Eles eram melhores amigos havia mais de quatro anos e costumavam comemorar o aniversário juntos. São são apenas dois dias que separam uma data e outra.
"Uma coisa que ele sempre falava para mim era para ajudar pessoas. Acho que esse foi o legado dele. Nem todo mundo é forte, temos nossos momentos de fraqueza. O dia de amanhã a Deus pertence", finaliza Vinícius.